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Boa Vista,20/10/2025

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Blog do Luiz Valério

As contas controversas de Teresa e o silêncio incômodo do Tribunal de Contas de Roraima

Ao aprovar com ressalvas uma gestão marcada por inconsistências graves, o TCE-RR enfraquece o próprio papel institucional e legitima a maquiagem contábil que distorce a transparência pública em Boa Vista

Reprodução/Relatório TCERR
As contas controversas de Teresa e o silêncio incômodo do Tribunal de Contas de Roraima Relatório do TCE-RR sobre as contas da ex-prefeita Tereza Surita apontou graves inconsistências contábeis, mas o órgão aprovou as contas com ressalvas, gerando questionamentos sobre a eficácia do controle fiscal.

Há decisões administrativas que falam mais pelo que omitem do que pelo que declaram. A aprovação “com ressalvas” das contas da gestão de 2018 da ex-prefeita de Boa Vista, Teresa Surita (MDB), pelo Tribunal de Contas do Estado de Roraima (TCE-RR), é um desses casos. O relatório técnico da própria Corte é inequívoco ao reconhecer irregularidades e inconsistências de natureza grave: cancelamento indevido de empenhos, divergências milionárias entre balanços, falhas de transparência, descumprimento de metas fiscais e até o não cumprimento de compromissos assumidos no Plano Nacional de Educação (PNE). Apesar disso, o parecer final optou pela indulgência institucional de uma “regularidade com ressalvas” — uma fórmula elegante para um problema profundo.

A questão que se impõe é simples: como uma gestão que apresentou tamanha quantidade de falhas contábeis e fiscais pôde ser considerada regular? O próprio relatório descreve uma cadeia de deficiências estruturais, que vão desde a maquiagem de números enviados aos sistemas federais — SICONFI, SIOPE e SIOPS — até a consolidação manual e frágil das contas do PRESSEM, o fundo previdenciário dos servidores municipais. Essas práticas, que ocultam a real situação financeira da capital, foram tratadas com a mesma leveza de quem examina um erro formal de digitação.

O parecer técnico não deixa dúvidas: houve cancelamento sem justificativa de R$ 8,5 milhões em restos a pagar processados, diferença de mais de R$ 140 milhões nas provisões previdenciárias e notas explicativas em desconformidade com as normas de contabilidade pública. A repetição de falhas já apontadas em anos anteriores — e nunca corrigidas — deveria, por si só, configurar um agravante, não uma atenuante. Ao manter o padrão de “ressalva”, o Tribunal normaliza a reincidência e reforça o sentimento de que em Roraima, a contabilidade pública é maleável ao peso político de quem governa.

Não é apenas uma questão técnica, mas moral e institucional. O TCE-RR tem a função de proteger o interesse público e de zelar pelo rigor fiscal do Estado, e não de suavizar a responsabilidade de gestores poderosos. Ao optar pela benevolência, a Corte transmite uma mensagem perigosa: irregularidades reiteradas e manipulações contábeis podem ser toleradas desde que acompanhadas de boas narrativas e aparente eficiência administrativa. Essa leniência compromete a credibilidade da fiscalização e desmoraliza o controle social das finanças públicas.

O caso de Boa Vista, durante as sucessivas gestões de Teresa Surita, revela mais do que falhas de gestão — expõe um modelo de administração sustentado em marketing, não em métricas reais de desempenho. A maquiagem administrativa, disfarçada em balanços e relatórios parciais, criou a ilusão de uma prefeitura equilibrada, moderna e eficiente. Entretanto, o parecer do TCE desmonta esse mito ao apontar que, sob o verniz da prosperidade urbana, havia fragilidade contábil, opacidade de informações e omissão institucional.

É legítimo questionar se o Tribunal de Contas agiu com independência e rigor técnico ou se preferiu o caminho mais cômodo da conciliação política. A aprovação com ressalvas, nesse contexto, não é apenas um ato burocrático — é uma decisão política travestida de tecnicismo. Uma Corte verdadeiramente comprometida com a integridade da gestão pública teria reconhecido que o conjunto de irregularidades de 2018 não cabia em uma categoria de “falhas sanáveis”, mas configurava um padrão sistêmico de omissão e descontrole.

O contribuinte de Boa Vista, que paga a conta dessa contabilidade criativa, merecia mais transparência e menos condescendência. O que o TCE chamou de “ressalva”, o cidadão entende como impunidade técnica. O controle externo, quando falha, se converte em cumplicidade. E, nesse caso, o maior prejuízo não é apenas financeiro: é institucional. Porque quando um Tribunal de Contas se omite diante da maquiagem de números, a corrupção moral se instala onde deveria prevalecer a defesa do interesse público.



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