No centro cirúrgico da Maternidade Nossa Senhora de Nazareth, em Boa Vista (RR), a emoção se misturava à técnica. De um lado, médicos concentrados num procedimento delicado, com olhos atentos e mãos firmes. Do outro, um pai ansioso, esperando notícias da companheira e do filho que ainda não nasceu. E, no centro de tudo, um gesto salvador: a transfusão de sangue realizada ainda dentro do útero para tratar uma anemia grave no feto.
Foi o que viveu a jovem Acássia Vitória Machado, de 27 anos, ao receber, na última quinta-feira (17), o diagnóstico de que seu bebê precisava de uma transfusão intrauterina urgente — e que, felizmente, o procedimento seria possível ali mesmo, em Roraima, pelo Sistema Único de Saúde.
“É o nosso segundo filho. Quando ouvimos que era algo raro, ficamos assustados. Mas logo vimos que os médicos estavam preparados. O cuidado deles nos deu segurança”, contou Breno Victor, também de 27 anos, pai do bebê, enquanto aguardava o fim da intervenção.
Este é o terceiro procedimento desse tipo já realizado na história da Maternidade, e o primeiro desde 2022. A transfusão foi indicada após exames laboratoriais e um ultrassom com Doppler fetal apontarem uma grave anemia no feto, provocada por uma incompatibilidade sanguínea entre mãe e bebê. A técnica consiste em injetar, ainda no útero, glóbulos vermelhos doados, ajudando a restabelecer a saúde do bebê e garantir o desenvolvimento até o nascimento.
“Se essa anemia não fosse tratada, o quadro poderia evoluir para complicações graves ou até a perda fetal. Felizmente conseguimos identificar a tempo e intervir”, explicou a médica obstetra Kelly Duarte, especialista em medicina fetal.
As hemácias utilizadas vieram do Hemoam, no Amazonas, o que revela a articulação entre centros públicos de saúde na Amazônia Legal para garantir o atendimento mesmo nos casos mais raros.
Para o diretor-geral da Maternidade, Manuel Roque, o retorno desse tipo de procedimento em Roraima é um avanço simbólico — e prático — para a rede pública.
“É um sinal de que estamos evoluindo. Conseguimos reunir profissionais capacitados, tecnologia e sensibilidade para salvar vidas. Isso representa o SUS que dá certo, com equidade e excelência mesmo longe dos grandes centros”, afirmou.
Hoje, Acássia segue em acompanhamento, e o bebê apresenta melhora nos indicadores. A família agora vive dias mais tranquilos, enquanto aguarda o nascimento com mais confiança.
“Foi um susto. Mas também foi um milagre da ciência e da saúde pública. Somos muito gratos a todos”, finalizou o pai.