O que você faz quando está diante de alguém problemático? Você tenta entender, tenta ajudar ou abandona esse alguém ao próprio infortúnio? Essa é uma pergunta que carrego comigo desde a juventude. Quando estava nos últimos anos da transição entre a adolescência e a vida adulta, enfrentei essa questão com meu pai, que lutava contra o vício em álcool. Não era falta de amor, muito pelo contrário. Eu o amava tanto que queria vê-lo livre daquela dependência, como quem deseja salvar um pássaro preso em uma gaiola invisível. Mas o medo também era uma constante. Temia que o vício o tirasse de nós cedo demais – e, infelizmente, foi o que aconteceu.
Meu pai e eu éramos parceiros na ourivesaria, mas também éramos parceiros em algo mais profundo: nossas discussões. Não brigávamos por falta de afeto, mas por excesso dele. Eu sempre o questionava sobre seus planos, sobre que exemplo queria me dar, já que eu era um jovem em formação. Nessas conversas, meu pai frequentemente calava, envergonhado. Em algumas raras ocasiões, cheguei a vê-lo chorar escondido, lágrimas que carregavam arrependimentos e impotência. Apesar de suas tentativas, como frequentar os Alcoólicos Anônimos, onde ficou sóbrio por dois anos e meio, ele teve uma recaída fatal, como tantas vezes acontece.
Nunca o culpei. Meu pai apenas repetiu o que viu em casa. Ele perdeu a mãe, a quem tanto amava, quando tinha apenas dez anos. Antes disso, já carregava em si o peso do vício alheio: aos nove anos, a caminho da quitanda para buscar as doses de cachaça que minha avó pedia, provava o líquido amargo, seduzido por sua curiosidade infantil e pelo cheiro forte. Assim, tornou-se um bebedor precoce, e a bebida foi sua companheira até o fim. Morreu aos 54 anos, em 1996, vítima de cirrose hepática. Foi uma vida breve, um sopro interrompido.
Fui eu quem segurou seu corpo rígido na pedra fria do necrotério. É uma dor que não se pode descrever com palavras; é como carregar nos braços não apenas um corpo, mas uma vida inteira que se esvaiu. Até hoje, a lembrança daquele momento pesa como um silêncio entre batidas do coração.
E então, volto à minha pergunta inicial: o que você faz diante de uma pessoa problemática? E se for alguém que você ama imensamente, como eu amava meu pai? Pois eu digo: você luta. Não é fácil. Não há garantias de sucesso. Mas o amor nos impele a tentar, porque desistir de quem amamos é desistir de parte de nós mesmos. Mesmo quando falhamos, ao menos ficamos com a certeza de que demos tudo.
Eu tentava mostrar meu amor ao meu pai por meio das nossas conversas, às vezes severas, que nada mais eram do que um grito disfarçado: “Pai, eu te amo tanto que não quero que você vá embora!” Infelizmente, ele se foi antes de conhecer sua neta, minha filha Teresa Júlia.
Hoje, acredito que a melhor forma de ajudar alguém que amamos é oferecer amor – um amor genuíno, que acolhe e cuida. Esse amor pode ser expresso de muitas formas: com palavras, com gestos, ou até com silêncio, quando necessário. Naquela época, eu ainda não tinha a fé que hoje tenho no poder da oração. Era cético quanto à espiritualidade e não compreendia o alcance desse gesto tão simples. Se pudesse voltar no tempo, em vez de repreendê-lo em diálogos por vezes bruscos, eu teria orado por ele.
O amor, quando dado de forma incondicional, é como a água que insiste em escavar rochas: pode demorar, mas transforma. Se você acredita, ore. Se não acredita, ame. Faça o que for possível para ajudar, porque não há dor maior do que a de olhar para trás e perceber que não lutou.
Quanto ao meu pai, hoje ele vive em minhas memórias. Cada vez que ouço a música Pai Herói, de Fábio Júnior, é como se ele estivesse ao meu lado, vivo em cada palavra da canção. “Pai / Você foi meu herói, meu bandido / Hoje é mais, muito mais que um amigo / Nem você nem ninguém tá sozinho / Você faz parte desse caminho / Que hoje eu sigo em paz (...)” – essas palavras dizem tudo o que eu gostaria de ter dito mais vezes enquanto ele estava aqui. Sempre que ouço, as lágrimas vêm. São lágrimas de saudade, mas também de amor.
Então, caro leitor, cara leitora, lute. Lute por quem você ama. E, acima de tudo, ame. Porque o amor é o único legado que permanece, mesmo quando tudo o mais se vai.