Edmilson, meu irmão mais velho, sempre foi um apaixonado por pescaria. Desde que me entendo por gente, recordo-me de vê-lo ajeitando suas tralhas com a destreza de quem molda um ritual. A cada saída rumo aos rios da região, retornava com o bornal cheio de peixes e um brilho de satisfação nos olhos. Ele parecia carregar consigo não apenas os frutos do rio, mas a serenidade que só quem conversa com a natureza entende. Como dizia Mark Twain, “o rio é um livro cujas páginas se viram sozinhas”.
Quando completei dez anos, ganhei o privilégio de me tornar seu escudeiro nessas expedições aquáticas. A pesca era uma aventura que fazia meu coração disparar como a máquina de uma velha locomotiva. Cada incursão pelo desconhecido me fazia sentir como um protagonista de um faroeste. Cruzávamos cercas, adentrávamos propriedades privadas em busca do melhor ponto no rio, e às vezes éramos surpreendidos por homens de rostos duros, que com um misto de autoridade e hostilidade nos mandavam embora. A tensão pairava no ar como nuvens carregadas antes da chuva, mas para mim, tudo era parte do espetáculo.
Foi em uma dessas aventuras que a vida me pregou uma peça inesquecível. Sérgio, meu melhor amigo e parceiro inseparável de pescarias, sugeriu um banho em um açude de águas cristalinas. Para um menino urbano, aquele imenso barreiro parecia mais uma piscina mágica, sem perigos à vista. Com a coragem impensada da infância, aceitei o convite e me joguei de corpo e alma, esquecendo um detalhe crucial: eu não sabia nadar.
No instante em que a água me envolveu, o mundo se tornou outro. A imensidão que antes era convite virou ameaça, e cada segundo parecia mais longo que uma eternidade. Eu me debatia em vão, engolindo goles de água e de desespero. Foi Sérgio quem se lançou para me salvar, vencendo seu próprio medo e segurando firme a minha mão. Se não fosse por ele, esta crônica jamais teria sido escrita.
Aquele dia no açude me ensinou lições que nenhum livro poderia oferecer. Primeiro, que a vida é como um rio: bela e fluida, mas cheia de correntes invisíveis que podem nos arrastar em um piscar de olhos. Segundo, que amigos verdadeiros são como âncoras — são eles que nos mantêm firmes quando a tempestade chega. Como Twain sabiamente colocou: “A verdadeira fonte de prazer não é o que temos, mas as pessoas com quem o compartilhamos.” Sérgio demonstrou na prática, de forma irrefutável, que uma amizade sincera se revela nos momentos cruciais da vida.
Edmilson ainda pesca, embora com menos frequência, e Sérgio seguiu outros caminhos. Mas o elo que nos une permanece forte como as raízes de uma velha árvore à beira do rio. Hoje, cada lembrança dessas aventuras me remete à importância de valorizar os momentos simples, os laços sinceros, e o extraordinário poder da amizade. A correnteza da vida pode ser impiedosa, mas ter com quem atravessá-la é o que faz toda a diferença.