Agora mesmo começou a cair uma chuvinha abençoada aqui em Boa Vista. O calor tem sido de matar ultimamente, e qualquer água que cai do céu para nos refrescar é motivo de comemoração. O atraso na escrita desta crônica acabou sendo providencial, pois posso usar como tema a sensação revigorante que essa breve precipitação nos traz. Que delícia! Eu, particularmente, gosto de admirar as nuvens pesadas no céu e o som dos trovões nas tardes chuvosas. Isso me traz memórias da minha infância no interior do Ceará.

A vida de quem escreve crônica é uma busca incessante por temas lúdicos que possam agradar os leitores. E, para mim, nada tem mais ludismo do que as coisas simples da vida, como o cair da chuva. Confesso que sou fascinado pelo clima bucólico que se instala na cidade quando o céu derrama suas águas sobre nós — principalmente nesses dias em que o sol parece decidido a nos abraçar com força, quase a nos sufocar. Por isso, invoco as palavras do poeta do sertão, o inesquecível e incomparável Patativa do Assaré, em seu poema A Chegada da Chuva: “E a chuva caindo em fios como açoite, / Noite e dia, sem cessar, / Faz a várzea virar rio, o riacho vira mar."

Sabe-se, porém, que as altas temperaturas que temos experimentado no Brasil e em outras partes do mundo, assim como as chuvas torrenciais que caem em certas regiões, são resultado das mudanças climáticas. Ainda há negacionistas que querem fechar os olhos para essa realidade, mas a situação de exaustão do nosso planeta está tão clara quanto a água. Negar que o clima global se desestabilizou de forma preocupante é querer tapar o sol com a peneira. Não há como ignorar.

Às vezes me pego refletindo sobre as condições de trabalho daqueles que ficam expostos ao sol escaldante nesses tempos de desajuste climático. Trabalhadores braçais como pedreiros, garis e agricultores sofrem muito, pois sua saúde é colocada em risco ao permanecerem tanto tempo sob os implacáveis raios de sol dos dias atuais. O aumento da temperatura global e a maior incidência de radiação solar têm relação direta com o crescimento dos casos de câncer de pele no Brasil.

Estudos indicam que cada grau Celsius a mais na temperatura pode resultar em um aumento de até 5% nos casos desse tipo de câncer. Por sua vez, o Instituto Nacional de Câncer (INCA) estima que surjam cerca de 185 mil novos casos de câncer de pele por ano no Brasil, representando 33% de todos os tipos de câncer. Isso significa que precisamos nos proteger da intensidade dos raios solares. E é por isso que uma chuvinha, uma mudança ainda que breve no clima, me traz tanta alegria.

Mas voltemos a falar da beleza da chuva. Apesar de ter nascido no Nordeste, uma região historicamente marcada por secas prolongadas e onde a inclemência do sol foi registrada nas poesias imortais de Patativa do Assaré e musicada por Luiz Gonzaga, eu gosto mesmo é do frio ou, pelo menos, das temperaturas mais amenas. Para celebrar a chuva que cai agora, invoco mais uma vez os versos de Patativa: "Chove, chuva, chove sem parar, / A terra seca vai se animar, / Verdeja o pasto, o gado vai fartar." 

Sim, bendita seja a chuva que caiu ontem à noite, que cai agora e aquela que esperamos cair nos meses seguintes, durante a nossa estação chuvosa aqui em Roraima.