O domingo foi dia de espairecer junto à natureza. Diante do calor escaldante que faz em Roraima por esses meses, nada melhor que fugir do frenesi da cidade e rumar para o interior, colocando o corpo de molho na água gelada de um igarapé. Foi o que eu e a Lu, minha esposa, fizemos ontem a convite de um casal de amigos. O melhor de tudo é que fomos para um banho particular, onde não havia mais que onze pessoas. Natureza, silêncio e paz. Que maravilha!
A natureza, em sua suprema sabedoria, nos presenteia com paisagens de tirar o fôlego. Enquanto eu me refrescava nas águas cristalinas e geladas do igarapé, pensava na beleza da criação divina. As árvores, de raízes imersas e galhos generosos, ofereciam sua sombra acolhedora. A água corria devagar e constante, enquanto centenas de peixinhos rodeavam nossos pés, beliscando suavemente aqui e ali, num balé de movimentos ritmados e inimitáveis.
Ouvir os sons da natureza é revigorante. A melodia da água corrente, com seus redemoinhos pontuais, vez ou outra batendo nas margens do igarapé por causa dos nossos movimentos desajeitados, dava o ritmo da tarde. Folhas boiavam preguiçosamente aqui e ali — sua missão nas árvores havia se cumprido; agora, eram matéria orgânica, adubo futuro que um dia alimentaria a floresta novamente. Tudo ali parecia tão lindo e perfeito, um ciclo que renovava tanto o ambiente quanto a alma.
Henry David Thoreau estava certo ao escrever que "a riqueza que obtenho vem da natureza, a fonte de minha inspiração". Hoje eu poderia escrever sobre qualquer outro tema, mas senti que precisava compartilhar com vocês as sensações que vivi ontem. A natureza me inspirou profundamente.
Sempre que me refugio na natureza, sou levado de volta às lembranças da infância. Nos dias da minha meninice, vivi momentos inesquecíveis em sítios e roçados, colhendo frutos dos mais variados: manga, goiaba, cajá, umbu, cajarana, banana… Outros dias eram dedicados a vigiar plantações de arroz, espantando os pássaros que se banqueteavam nos cachos de grãos ainda por colher. Hoje, olhando em retrospecto, percebo que, apesar de pobre em recursos financeiros, minha infância foi uma imensidão de riqueza em experiências e momentos de alegria genuína.
Concordo plenamente com Charles Dickens quando ele diz que “a memória de uma infância feliz é uma das maiores bênçãos que alguém pode ter”. Curioso como a gente só reconhece plenamente as experiências felizes quando elas já se tornaram memórias. Mas perceber que fui uma criança feliz e que, hoje, sou fruto de tudo o que vivi é motivo de uma gratidão absoluta. Viver em contato com a natureza é uma das maiores dádivas que se pode ter.
Antoine de Saint-Exupéry, o autor de O Pequeno Príncipe, disse que “todas as pessoas grandes foram um dia crianças — mas poucas se lembram disso”. Talvez uma das formas de nos tornarmos adultos melhores seja buscar na memória aquilo que fomos quando crianças. E, mais que isso, sermos gratos por termos chegado até aqui, com sucesso, com lembranças e com histórias.
Luiz Valério é jornalista, escritor e podcaster.
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