A tarde de quinta-feira seguia quente e abafada, como têm sido todos os dias deste mês de outubro. De repente, sem aviso, as nuvens se organizaram no céu, num balé quase sagrado, prenunciando a chegada da chuva. Não demorou para que uma chuva fina, mas contínua, começasse a cair, ora aqui, ora ali, sobre a cidade. Os pingos, como sapateadores habilidosos, tamborilavam nas telhas de zinco, criando uma melodia suave, uma música simples e encantadora para os ouvidos. Em poucos minutos, o calor abrasador do verão roraimense deu uma pausa.
Essas chuvas vespertinas sempre me trazem de volta as lembranças da minha infância, quando, no Juazeiro das minhas memórias, o céu também se fechava sob nuvens pesadas. Logo caía aquela chuvinha gostosa, e o cheiro de café fresco vindo da cozinha preenchia o ar, transformando as tardes em momentos quase mágicos. Que tempos eram aqueles! Corríamos pelas ruas, debaixo das biqueiras, aproveitando cada gota que o céu generosamente despejava. A chuva, naquela época, era mais do que uma simples precipitação — era um presente, uma brincadeira.
A beleza não parava com a chuva. Logo depois, o céu nos brindava com o surgimento de um arco-íris, colorindo o horizonte e alimentando a nossa imaginação. De onde vinha aquele arco de cores? Para onde ele ia? Mamãe sempre nos dizia, com ar de mistério, que no fim do arco-íris havia um tesouro escondido, mas que ninguém jamais conseguia encontrá-lo. A verdade é que, criança ou adulto, a chuva tranquila e o arco-íris são sempre fontes de alegria e fascínio.
Hoje, em tempos de calor extremo aqui no Norte, uma chuva como essa tem um sabor ainda mais especial. As altas temperaturas, intensificadas pelas mudanças climáticas, fazem do cair da chuva um verdadeiro motivo de celebração. Roraima sempre teve temperaturas elevadas por estar próximo à Linha do Equador, mas nos últimos anos, o calor tem se tornado cada vez mais insuportável.
A situação se agrava com a redução dos níveis do Rio Branco, o que resulta em racionamento de água e torna o cotidiano ainda mais complicado. Por isso, quando a chuva chega, é como uma bênção. Sempre que começa a chover, eu paro o que estiver fazendo para admirar o espetáculo da água que cai do telhado, dançando de forma ritmada. Não resisto e, com meu celular em mãos, registro tudo em câmera lenta, para prolongar ainda mais aquele momento de beleza pura. E assim a vida segue, oscilando entre os extremos do calor e da chuva, entre a aridez e a graça da natureza. São esses pequenos contrastes que tornam a existência tão rica e surpreendente.
Luiz Valério é jornalista, escritor e podcaster.
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